sexta-feira, 23 de maio de 2014



PREVARICAÇÃO






À luz dos princípios implícitos e explícitos, que regem a Administração Pública e toda a Constituição Federal, devem ser destacados, para o presente estudo, o princípio da legalidade e da impessoalidade. O princípio da legalidade é um princípio administrativo expresso na Carta Magna, segundo o qual a lei é o elemento que norteia a conduta do agente público e, por via de consequência, do funcionário público. Maria Sylvia Zanella di Pietro (2014) ensina que, ao contrario do que acontece nas relações particulares, a Administração publica deve, sempre, agir pautada pela lei. É o que se chama de legalidade estrita. Cabe salientar ainda que o agente público possui um poder, devendo ser vislumbrado como um poder-dever, visto que, se em determinado caso a lei o obriga a agir, em regra, o agende deve (obrigatoriamente) fazê-lo. 

Já o princípio da impessoalidade estabelece que não é lícito que se trate de forma privilegiada os administrados, nem tampouco que estes sejam prejudicados por critérios pessoais. Assim, o agente público deve se portar de forma impessoal, não fazendo distinções de qualquer natureza entre os administrados. 

Por fim, deve-se dizer que todo ato administrativo (que será praticado por um agente público), deve conter vários elementos, dentre os quais se destaca a finalidade que deve, invariavelmente, ser pública. Isto é, todo ato administrativo deve ter como objetivo o aspecto social.

O presente trabalho busca elucidar o crime tipificado no art. 319 do Código Penal, a Prevaricação. Por se tratar de crime próprio de funcionários públicos, necessária se fez uma breve análise de alguns princípios administrativos que em muito auxiliarão na presente abordagem.


Prevaricação

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.


Análise Doutrinária


O crime de prevaricação possui no entendimento de Greco (2010) um “traço Marcante” qual seja, o retardamento, a abstenção de pratica de um ato de ofício ou a pratica de um ato contrario à lei, com o fito de satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Nesse sentido, Fragoso, citado por Greco (2010) faz uma explanação acerca do que é interesse pessoal e sentimento pessoal conforme se vê abaixo:

“o interesse pessoal pode ser de qualquer espécie (patrimonial, material ou moral). O sentimento pessoal diz com a afetividade do agente em relação às pessoas ou fatos a que se refere a ação a ser praticada, e pode ser representado pelo ódio, pela afeição, pela benevolência, etc. A eventual nobreza dos sentimentos e altruísmo dos motivos determinantes são indiferentes para a configuração do crime, embora possam influir na medida da pena”.

Greco (2010) classifica o crime de prevaricação como sendo próprio em relação ao sujeito ativo, visto que somente funcionário público pode praticá-lo e comum quanto ao sujeito passivo, já que podem ser prejudicados a própria Administração Pública bem com algum particular; doloso; comissivo (quando o agente retarda ou pratica o ato em desconformidade com a lei) ou omissivo próprio (quando o agente deixa de praticar o ato de ofício); de forma livre e unissubsistente (ou plurissubsistente).

Quanto ao sujeito ativo, trata-se de crime próprio, visto que a tipicidade do crime está condicionada ao fato de o agente ser funcionário público. No entanto, quanto ao sujeito passivo, além da própria Administração Pública, qualquer pessoa pode ser prejudicada pelo retardamento, pela omissão do agente público ou pela pratica de ato contrario a lei. Greco (2010) ainda salienta que pessoa jurídica pode ser sujeito passivo do crime ora em análise.

Ainda segundo o autor supracitado, o objeto material do crime é “o ato de ofício que fora retardado, ou deixado de ser praticado, bem como aquele praticado contra disposição legal”. Quanto ao bem jurídico que o crime em estudo visa proteger, seria a própria Administração Pública.

O momento consumativo, segundo Greco (2010) se dá quando o funcionário público, com a “finalidade de satisfazer interesse ou sentimento pessoal” pratica um dos núcleos do tipo, ou seja, quando retarda a pratica de um ato de oficio, quando não o pratica ou quando o pratica em desacordo com a lei.

Por fim, é importante salientar que existe no artigo 327 do código penal uma causa especial de aumento de pena. Segundo tal dispositivo, a pena é aumentada de um terço se o crime em análise for praticado por ocupante de cargo em comissão ou de função de confiança ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.

Exemplo

João, fiscal sanitário da cidade de Coelhos, detecta que o estabelecimento comercial de seu amigo de infância, Roberto, não possui as condições mínimas de higiene, devendo, por conseguinte, ser multado ou até mesmo lacrado. O estabelecimento em questão está situado na área de atuação de João. No entanto, este, para não se indispor com seu amigo, deixa de praticar o ato administrativo a que estava obrigado por dever funcional.

(adaptado do site: http://www.mppr.mp.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=2294) do Ministério Público do Paraná)

O caso simples acima narrado evidencia um fato típico de prevaricação. João, o fiscal sanitário, deixou de praticar um ato a que estava obrigado, o que caracteriza o crime em questão devido à omissão própria do funcionário público. Tal omissão se deu em caso, para satisfazer interesse pessoal, qual seja o desejo de não se indispor com seu amigo de infância. Nesse caso, a conduta de João se amoldaria de forma perfeita ao que estabelece o art. 319 do Código Penal.

Vale ressaltar ainda que o mesmo crime poderia ter sido praticado em outra hipótese. Suponha-se que o mesmo fiscal, João, tenha um inimigo declarado, Joaquim, que tem um estabelecimento comercial em conformidade com todas as regras exigidas para o funcionamento. No entanto, a despeito da perfeição com o que Joaquim exerce suas atividades, João aplica-lhe uma sanção simplesmente para prejudicar seu desafeto.

Nesse caso, o crime existiria porque o agente teria praticado o ato de forma contraria à lei, vez que somente os estabelecimentos em desacordo com as exigências legais devem sofrer sanção. Ainda se vislumbra a possibilidade de o crime se dar para satisfação de interesse pessoal, visto que o agente poderia ter aplicado a multa no intuito de prejudicar seu inimigo, devendo, se verificar o dolo do agente.






REFERÊNCIAS

GRECO, Rogério.Curso de Direito Penal, parte especial, Vol.II. 8ed. Niteroi:Editora Impetus,2011 

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 24ed. São Paulo: Editora Atlas, 2014 

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm> acesso em 24 mar. 2014 

quarta-feira, 14 de maio de 2014



FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO OU OUTRA FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL DE VULNERÁVEL





A prostituição pode ser entendida como o ato ou prática de relações sexuais em troca de dinheiro ou objetos que suprem necessidades básicas, como a alimentação, vestimentas ou ainda em troca de abrigo.

Com o princípio da intervenção mínima, cabe ao direito penal tutelar apenas as situações em que haja perigo de dano ao bem jurídico.

Se uma pessoa maior e capaz decidir pela prostituição, não será punido aquele que a ajudar ou se deixar sustentar por ela. Desde que não haja violência, fraude, engano, exploração de situação de vulnerabilidade. 

Porém, esta prática será punida quando houver favorecimento a prostituição por um menor, ou por um incapaz.

O crime de favorecimento de prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável está previsto no artigo 218 – B e foi introduzido no Código Penal Brasileiro pela Lei 12015/2009. 

O referido artigo dispõe que:

      Art. 218-B. Submeter, induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, alguém menor de 18 anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a      prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que alguém a abandone:
 Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos.
§ 1º Se o crime é praticado com fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.  § 2º - Incorre nas mesmas penas:I – quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18(dezoito) anos e maior de 14 (catorze) anos na situação descrita no caput deste artigo.II – o proprietário, o gerente ou responsável pelo local em que se verifiquem as práticas referidas no caput deste artigo.§ 3º - Na hipótese do inciso II do § 2º, constitui efeito obrigatório da condenação a cassação da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento.

Essa espécie de crime tem por objetivo a moral sexual daquelas pessoas que são consideradas vulneráveis.
A doutrina classifica como vulnerável a pessoa, seja homem ou mulher, que ainda não completou 14 anos de idade, ou com 14 anos ou mais, que não tem o necessário discernimento para a prática do ato sexual, em razão de enfermidade mental ou deficiência mental.

Também são considerados vulneráveis aqueles com 14 anos ou mais de idade, que por qualquer outro motivo não pode oferecer resistência, como portadores de necessidades especiais com problemas físicos graves. 

O sujeito ativo dessa ação pode ser qualquer pessoa, seja homem ou mulher. Já o sujeito passivo só poderá ser uma pessoa menor de dezoito anos, ou aquele que possui alguma enfermidade mental que o faz não possuir total discernimento para prática do ato. E ainda os portadores de necessidades especiais.

Mas, como bem assevera Greco (2011), o agente somente poderá ser responsabilizado pelo ilícito quando conhecer a idade da pessoa que por ele for submetida, induzida ou atraída à prostituição. Caso contrário, erro sobre a idade da vítima irá desclassificar o fato previsto no art. 218-B.

Contudo, embora o tipo penal só mencione o menor de 18 anos, para configuração do crime, salientamos que a idade mínima é 14 anos, pois se ocorrer em menores de 14 anos seria tipificado não como crime de exploração e sim de estupro.

Para Ricardo (2011), a conduta consiste em praticar conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso com vitima, em situação de prostituição ou outra forma de exploração sexual, que tenha sido submetida, induzida, atraída ou facilitada à prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou que tenha sido impedida ou dificultada de abandoná-la.

Trata-se de crime doloso que se consuma com a prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso com vitima em situação de prostituição ou qualquer outra maneira de exploração sexual.

A conduta típica vem expressa nos verbos. Onde o agente poderá submeter ou induzir a vítima à prostituição; atraí-la, facilitar-lhe a prostituição ou impedi-la, ou dificultar que a abandone. 

Na modalidade submeter, quando a vitima é sujeita à prostituição ou qualquer outra forma de exploração sexual, iniciando a entrega sexual;
Na modalidade induzir, quando a vitima é conduzida à prostituição ou qualquer outra forma de exploração sexual, iniciando a entrega sexual;
Na modalidade atrair, que a vítima é conduzida à prostituição qualquer oura forma de exploração sexual, iniciando a entrega sexual;
Na modalidade facilitar, quando o agente pratica qualquer ato tendente a tornar mais fácil a prostituição ou qualquer outra forma de exploração sexual da vítima;
Na modalidade impedir , quando o ante efetivamente obsta o abandono, pela vitima da prostituição ou qualquer outra forma de exploração sexual;
Na modalidade dificulta, quando o agente torna difícil ou complica o abandono da prostituição ou qualquer outra forma de exploração sexual. 
                                                             (Ricardo Andreucci, 2011)
Segundo o entendimento de Fernando Capez este delito consuma-se quando:
“O crime se consuma no momento em que a vítima passa a se dedicar habitualmente à prostituição, após ter sido submetida, induzida, atraída ou ter facilitada tal atuação pelo agente, ou ainda quando já se dedica usualmente a tal prática, tenta dela se retirar, mas se vê impedida pelo autor. Convém ressaltar que não se exige habitualidade das condutas previstas no tipo do art. 218-B, bastando seja praticada uma única ação de induzir, atrair etc. Deve-se consignar, no entanto, que, para a consumação, será necessário que a pessoa induzida passe a se dedicar habitualmente à prática do sexo mediante contraprestação financeira, não bastando que, em razão da indução ou facilitação, venha a manter, eventualmente, relações sexuais negociadas. Assim, o que deve ser habitual não é a realização do núcleo da ação típica, mas o resultado dessa atuação, qual seja, a prostituição da ofendida. Não havendo habitualidade no comportamento da induzida, o crime ficará na esfera da tentativa.” (Fernando Capez, 2010)

Vale ressaltar que esse crime não é considerado delito habitual, de modo que basta que o agente favoreça uma única vez a prostituição para que haja a configuração desse tipo de pena. E a ação será pública e incondicionada.


CASO ESPECÍFICO:

Presos cinco pedófilos que ofereciam teste em escolinhas de futebol para adolescentes

 Eles traziam meninos do interior para BH com a promessa de teste em escolas de futebol de clubes famosos de Minas, mas os meninos ficavam em um sítio sendo abusados.

A Polícia Civil prendeu nesta quinta-feira cinco envolvidos em uma rede de exploração sexual de adolescentes em Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, e Belo Horizonte. A senha para o crime de pedofilia, segundo a Polícia Civil, eram testes em escolas de futebol de clubes famosos de Minas. Os meninos eram ludibriados com a oferta de serem submetidos às provas, mas acabam aliciados e abusados sexualmente.

Trata-se de uma apuração há cerca de cinco meses, quando um adolescente denunciou à polícia que foi procurado para um programa sexual. De acordo com o delegado, os envolvidos levaram adolescentes com idades entre 14 e 17 anos, do interior para a capital, com a permissão das famílias, sob a alegação de que eles seriam testados em times grandes.

Os meninos eram trazidos para um sítio na cidade de Esmeraldas, na Grande BH, onde ficam alojados sofrendo abusos sexuais constantes.

Além dos mandados de prisão, também foram cumpridos ordens para apreensão de materiais na casa dos envolvidos. A polícia recolheu computadores, celulares, além de fotos e vídeos com adolescentes nus.

Além da promessa de teste nos clubes, os adolescentes eram aliciados com dinheiro e ingressos para shows. Todos os presos vão responder por favorecimento a prostituição e exploração sexual de vulnerável.

Conforme reportagem acima, temos o induzimento a varias pessoas ao mesmo tempo, o que diz respeito ao emprego de promessas, súplicas, ou seja, um ato que inspira alguém a fazer alguma coisa, fazendo-a crer que a sua submissão à lascívia do terceiro lhe iria proporcionar riqueza ou uma vida melhor. E a prática de ato libidinoso de qualquer espécie com vulneráveis maior de 14 e menor de 18 anos submetidos, induzidos, atraídos, ou que tiveram facilitada a prostituição, dificultado ou impedido o seu abandono por outra pessoa. Podemos destacar que é a conduta do ato se se destina a vitima determinada.

Como mencionado ao caput do artigo 218-B do CP, verifica-se que as condutas do sujeito ativo são de submeter, induzir, atrair, dificultar, facilitar ou impedir que alguém abandone a prostituição. Nas quais denominamos de condutas habituais.

A forma de indução, por exemplo, somente pode ser relevante se a vítima efetivamente passar a se prostituir com habitualidade ou for explorada sexualmente.

http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2013/12/05/interna_gerais,476463/presos-cinco-pedofilos-que-ofereciam-teste-em-escolinhas-de-futebol-para-adolescentes.shtml








REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ANDREUCCI, Ricardo Antonio. Manual de direito Penal. 7 ed. Ed saraiva. 2011. São Paulo. Paginas 371 a 373

CASTRO, Leonardo. Crimes Contra a Dignidade Sexual – Artigo por Artigo – Art.218. Disponível em: http://www.forumcriminal.com.br/discussion/415/crimes-contra-a-dignidade-sexual-artigo-por-artigo-art-218-b.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm>

http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=2853&idAreaSel=4&seeArt=yes.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Especial. 8ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: Parte Especial. v.2. São Paulo: Saraiva, 2010.